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Reserva cognitiva como fator de prevenção do desenvolvimento de demências

Você já ouviu a expressão “quem guarda tem”? Essa simples frase pode ser inserida em diversos contextos. Imagine as seguintes situações: uma pessoa que investiu dinheiro na poupança dos 20 aos 60 anos, e outra pessoa que trabalhou durante 40 anos, mas nunca guardou dinheiro. Ao chegar na velhice qual dessas duas pessoas terá maior possibilidade de acesso a bens e serviços que contribuam com a qualidade de vida?


É fácil considerar que as pessoas que conseguem poupar recursos financeiros ao longo da vida, teoricamente desfrutarão de alguns privilégios, comparadas a outras pessoas em diferentes condições financeiras. Tais privilégios podem estar relacionados à área na saúde, a oportunidades de lazer ou a condições de moradia, por exemplo.


Assim como quem guarda dinheiro no presente, provavelmente terá recursos no futuro, quem cuida da saúde do cérebro ao longo da vida, têm maior possibilidade de usufruir de boa saúde cognitiva na velhice. O modo de “poupar” saúde cognitiva é conhecido cientificamente como Reserva Cognitiva (RC).


O primeiro estudo que investigou a RC ocorreu na década de 1980, quando um neurologista chamado David Snowdon analisou a melhora progressiva das habilidades cognitivas de um grupo de freiras. Em uma autópsia realizada no cérebro de uma das freiras, o pesquisador descobriu a presença de características compatíveis com os sinais estruturais da Doença de Alzheimer, no entanto esta freira não apresentou sintomas avançados em vida. Este resultado permitiu que outros estudiosos investigassem e reforçassem a relação existente entre exercícios cognitivos e a proteção do cérebro contra prejuízos causados por doenças neurodegenerativas.


Conforme descrito por outros pesquisadores o conceito de reserva cognitiva pode ser definido como fator que protege o cérebro das modificações causadas pelo processo de envelhecimento e alterações devido a presença de doenças neurodegenerativas, como as demências, por exemplo, a Doença de Alzheimer. Isso significa que pessoas que não desenvolvam demências terão maior capacidade de desempenho cognitivo e pessoas que sejam diagnosticadas com demência terão o progresso dos sintomas da doença mais lentificados.


Sabemos que o principal modo de ter dinheiro para poupar é através do trabalho e existem diversos materiais que ensinam as melhores formas de investimentos de acordo com o perfil e condições pessoais. Mas qual seria a forma de adquirir reserva cognitiva? Não existe apenas uma forma, mas diferentes maneiras, que podem contribuir de modo mais ou menos expressivo, também de acordo com o perfil e características individuais.


Apresentaremos a seguir, alguns caminhos que estudiosos têm apontado como influentes na formação de RC.


Escolaridade: quanto maior o tempo de estudo, maior a capacidade de criação de RC;


Bilinguismo: pessoas fluentes em mais de um idioma tendem a apresentar maior preservação cognitiva;


Condições socioeconômicas: quanto maior a vulnerabilidade devido a condições sociais, como acesso restrito a serviços de saúde e menor poder aquisitivo, menor capacidade das habilidades cognitivas;


Hábitos de vida: manter um estilo de vida ativo, com prática de atividade física por exemplo, auxilia na preservação da saúde do cérebro;


Tipo de ocupação profissional: atividades de trabalho de maior complexidade podem estar associadas a sintomas de declínio cognitivo mais tardios;


Atividades de lazer e de estimulação cognitiva: jogos de tabuleiro, palavras-cruzadas, leituras, atividades manuais e exercícios cognitivos são algumas maneiras de estimular a cognição e preservar as funções cognitivas como memória, atenção e raciocínio lógico.

É importante destacar que nunca é tarde para cuidar da saúde do cérebro, criar novas conexões neuronais e formar reserva cognitiva. Sendo assim, utilize dos recursos que você tem disponível e invista na sua poupança da saúde.


Bibliografia consultada:


Andrade-Filho, A. S., Dunningham, W. A. Estudo dos cérebros das freiras. Revista Brasileira de Neurologia e Psiquiatria. 2018 Maio/Ago;22(2):108-109.

Apolinário, D., Vernaglia, I. F. G. Estilo de Vida Ativo e Cognição na Velhice. [In] Freitas, E. V.; PY, L. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 3a Edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, p. 2267 - 2274, 2016.


Brandebusque, J. C., Cipolli, G. C., Alonso, V., Defanti, F. M. G., & Cachioni, M. (2020). Reserva cognitiva e os diferentes perfis de ganho cognitivo em idosos: Uma scoping review. Psico, 51(4), e33842. https://doi.org/10.15448/1980-8623.2020.4.33842

Snowdon, D. A., Kemper, S. J., Mortimer, J. A., Greiner, L. H., Wekstein, D. R. and Markesbery, W. R. (1996). Linguistic ability in early life and cognitive function and Alzheimer’s disease in late life – Findings from the nun study. JAMA, 275, 528–532.


Texto escrito por:


Gabriela dos Santos, Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Gerontologia pela Universidade de São Paulo (USP), Graduada em Gerontologia pela USP, com Extensão pela Universidad Estatal Del Valle de Toluca. Assessora científica.


Profa. Dra. Thais Bento Lima-Silva, Docente do curso de Graduação em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), Coordenadora do curso de pós-graduação em Gerontologia da Faculdade Paulista de Serviço Social (FAPSS), pesquisadora do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG). Membro da diretoria da Associação Brasileira de Alzheimer- Regional São Paulo. E assessora científica e consultora do Método SUPERA.

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